Odebrecht contou com Nogueira para defender seus interesses

14/04/2017 10:45:00

É o que revela planilha inclusa em processo da Lava Jato; papel aponta doação de R$ 50 mil ao prefeito de Ribeirão Preto

Ponta Porã teria sido o codinome usado para a doação de R$ 50 mil ao prefeito Duarte Nogueira, em 2010 (Foto: Weber Sian / A Cidade)

 

A Odebrecht contava com a “disposição” de Duarte Nogueira (PSDB) para “defender projetos de interesse da companhia” como contrapartida à doação de campanha por meio de caixa 2. É o que revela uma planilha da empreiteira inclusa nas provas da Operação Lava Jato, com 558 doações feitas a políticos – entre elas uma de R$ 50 mil em 2010 para “Ponta Porã”, codinome do atual prefeito de Ribeirão Preto.

Na edição desta quinta-feira (13), A Cidade mostrou que três executivos da Odebrecht acusam Nogueira de receber caixa 2 na campanha de 2010. Dois citam R$ 50 mil sob apelido “Ponta Porã” e outro afirma que seriam R$ 350 mil pelo codinome “corredor”. Em 2014, ele recebeu mais R$ 300 mil, desta vez por meio de doação oficial.

Ele nega irregularidades e ainda não é formalmente investigado. As acusações contra ele foram remetidas à Procuradoria Regional da República.

O apoio de Nogueira a projetos da Odebrecht, principalmente no setor agroindustrial, em troca da doação já havia sido revelada por Claudio Melo, diretor de relações institucionais da empreiteira, em delação que veio a público em dezembro do ano passado.

Claudio contou, também, que em 2008 procurou Nogueira, então deputado federal, para ajudar na licitação da Usina Hidrelétrica de Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia.

Na abertura do inquérito 4436, que investiga o senador Aécio Neves (PSDB), o ministro do STF Edson Fachin explica que os executivos da Odebrecht “relatam a promessa e pagamento de vantagens indevidas em benefício do Senador e do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB)” em troca de interesses da empreiteira nas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio.

Nesse inquérito, foi anexada uma ata de audiência pública realizada pela Câmara dos Deputados em dezembro de 2008 para tratar do edital da usina de Jirau, com representantes das agências de controle do Governo Federal.

A Odebrecht tentou vencer a licitação de Jirau naquele ano, mas perdeu para um consórcio concorrente, e alegava falhas e mudanças no edital para tentar anular o certame.

Apesar das supostas irregularidades, a licitação foi mantida e a usina inaugurada em dezembro de 2016.

Na audiência, Nogueira era o deputado responsável pela relatoria da proposta de fiscalização e controle e foi um dos que mais apontou indícios de falhas e de ilegalidades na construção, como a mudança do local da hidrelétrica. Seu conhecimento dos pormenores técnicos, inclusive, foi elogiado pelos presentes.

Nogueira diz que sua atuação foi, como parlamentar de oposição, na fiscalização e nas defesa dos interesses públicos.

Documentos públicos

O ministro do STF Edson Fachin levantou o sigilo e tornou públicos os documentos e vídeos da delação da Odebrecht. A planilha com o propósito das doações, pedido de investigação do Janot e ata de audiência da Câmara foram obtidas pelo A Cidade no “Lava Jota”, sistema de consulta criada pelo portal de notícias jurídicas “Jota”.

Gabinete foi palco de pedido de doação

Um executivo da Odebrecht alega que foi chamado por Nogueira em seu gabinete no Congresso Nacional e recebeu pedido de doação para a campanha eleitoral de 2014.

“A pedido do parlamentar, esteve no seu gabinete na Câmara dos Deputados, oportunidade em que foi novamente demandado a fim de que a Odebrecht fizesse contribuição para a campanha eleitoral do então Deputado Federal. A contribuição feita em 2014, conforme relatou Claudio Melo, deu-se por meio de doação eleitoral oficial”, afirma documento assinado pelo Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, obtido pelo A Cidade.

O documento, datado de 13 de março de 2017, pede ao STF que Nogueira seja investigado pela Procuradoria Regional da República, em razão do tucano estar licenciado do cargo de deputado federal.
Foi devido a esse documento que Nogueira foi incluído na “lista de Janot”, conforme o Jornal Nacional mostrou em 15 de março.

Janot diz, no pedido de investigação, que Claudio Melo, um dos delatores, cita que no sistema de controle de repasses ilícitos da Odebrecht consta R$ 300 mil a Nogueira em 2010. Na delação, Melo citou R$ 350 mil.

Delação e doação ao ‘corredor’

Acordo de colaboração premiada do executivo Claudio Melo, que se tornou público em dezembro do ano passado, aponta que Nogueira era chamado de “corredor” pela empreiteira, e teria recebido R$ 350 mil de caixa 2 em 2010 e R$ 300 mil, por meio de doação oficial e declarada à Justiça Federal, em 2014.

Combativo

Em audiência na Câmara em 2008, Nogueira foi um dos deputados mais combativos ao apontar supostas irregularidades no leilão da hidrelétrica de Jirau e na mudança do local de construção da usina. Sua manifestação inicial rendeu duas páginas e meia de perguntas aos técnicos do governo federal, segundo documento com a ata da reunião.

Planilha do caixa 2

A Odebrecht entregou planilha com a contabilidade de 558 repasses a agentes públicos para fins de campanha eleitoral. Cada linha representa um doação, com informações como nome e codinome do beneficiado, cargo disputado, ano, situação nas urnas e “propósito” da doação - como o apoio do político aos interesses da empreiteira.

Acusações sem fundamento

Nogueira ainda não é formalmente investigado na Lava Jato. Por não ter foro privilegiado no STF, os documentos relativos a ele foram encaminhados à Procuradoria Regional da República e ao Tribunal Regional Federal (TRF), que decidirão os próximos andamentos.

O despacho do ministro Fachin relativo a ele cita, apenas, indícios de caixa 2. Não há menção à Usina de Jirau no documento.

Em nota, Nogueira afirmou que, como “líder da oposição e crítico constante aos governos do PT, não há nenhum fundamento nas acusações de que teria recebido doações e/ou agido para defender interesses de empresas junto a órgãos da administração federal”.

Ele ressalta, também, que como parlamentar atuava na “fiscalização e na defesa dos interesses públicos”, e que todas as doações recebidas nas campanhas de 2010 a 2014 foram declaradas à Justiça Eleitoral.



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