Hospital das Clínicas é condenado a pagar pensão vitalícia

31/07/2014 16:17:00

Caso aconteceu há dez anos, em um parto de gêmeos; família luta para dar estrutura ao filho

Lucas Mamede / Especial
Vitor nasceu depois do irmão gêmeo, em uma cesárea, mas demora na intervenção causou falta de oxigenação e danos físicos e mentais (foto: Lucas Mamede / Especial)

Helena Aparecida vai sentir as dores do parto por toda a vida. Foram dezoito horas de espera e angústia para o nascimento do primeiro gêmeo, de parto normal. Quando juntava as forças para dar à luz ao segundo, veio a gritaria entre os médicos, o anúncio de uma cesárea inesperada e o apagão. Anestesiada às pressas, dormiu e nem chegou a ver o segundo filho nascer.

Só conheceu o menino quatro dias depois, na UTI. A hemorragia que quase lhe tirou a vida não doeu tanto quanto a notícia. Faltou oxigênio ao bebê e os danos foram irreversíveis.

Gabriel custa a entender um irmão tão igual e tão diferente. Os gêmeos estão hoje com 10 anos. “Eu queria que ele sarasse para jogar bola comigo”. Vitor nunca vai sarar. “A incapacidade é total desde o nascimento”, atesta laudo pericial.

Nesta semana, a Justiça entendeu que o parto foi responsável pelo dano causado a Vitor e, em antecipação de tutela, condenou o Hospital das Clínicas de Ribeirão a pagar pensão vitalícia de R$ 3,5 mil mensais ao menino. A demora “na intervenção médica na realização do parto cesárea”, de acordo a decisão, causou a falta de oxigênio que deixou Vitor com problemas físicos e mentais. No processo, a família ainda pede indenizações.

Vitor toma quatro remédios controlados por dia, passa por atendimento na Apae e precisa de acompanhamento médico constante. Ele tem comportamentos agressivos, anda com dificuldades, não fala, é totalmente dependente. “Eu escuto o Gabriel jogando bola na rua e penso que o Vitor poderia estar lá”.

Helena tinha 39 anos quando engravidou. “Tive uma gestação normal”. Moradora de Bonfim, ela fazia acompanhamento na unidade de saúde local, mas pelos gêmeos, os médicos a encaminharam para o HC.
Ela conta que chegou ao HC às 6h da manhã do dia 10 de maio de 2004. Em um primeiro momento, os médicos aplicaram medicação para induzir as contrações e realizar a cesárea. Houve troca de profissionais e o que assumiu o caso optou pelo parto normal.

Gabriel só nasceu à 0h33 do dia 11, mais de 18 horas depois. Só ao tirar o primeiro bebê o médico percebeu que não havia como Vitor nascer de parto normal. Entre essa percepção e o nascimento do garoto, Helena diz que demorou mais uma hora. “Se os médicos tivessem feito de outra forma, o Vitor seria saudável”. 

Pensão é uma conquista

Vitor passou 27 dias no hospital. Helena Aparecida, que também se recuperava de hemorragia e de tratamento para o útero, machucado durante o procedimento, viveu a tristeza de ir para casa levando apenas um dos filhos. “Quando você está grávida de gêmeos, se prepara para ter dois filhos. Eu amamentava o Gabriel pensando no Vitor”. 

A família se desdobrava entre a casa e o hospital. A primeira filha de Helena estava com três anos na época. “O dia em que ele teve alta, eu não conseguia acreditar”. 

A luta, porém, só começava. Helena se desdobra para dar ao filho a estrutura que ele precisa. Pelas várias vezes em que levou o menino à unidade de saúde e não encontrou médicos, paga convênio. O marido sustenta a casa sozinho, para cuidar do Vitor, a mãe deixou o trabalho de diarista. 

Ela sonha com tudo o que poderá proporcionar ao filho com a pensão. “Eu quero que ele faça equoterapia, musicoterapia.” 

Hospital das Clínicas diz que vai recorrer

No processo contra o Hospital das Clínicas, instaurado em maio de 2011, além da pensão, a família de Vitor pede indenização por danos morais, estéticos e materiais. O valor será definido pelo juiz. “Eu acredito na justiça divina, mas aqui na terra meu filho precisa de recursos”, explica a mãe, Helena Aparecida.  

Para o advogado do caso, José Augusto Aparecido Ferraz, a ação tem múltiplos fins. “Buscamos ressarcir o Vitor dessa situação, punir e também educar para que não aconteça mais”. 

Em nota, a assessoria de imprensa do HC informou que o processo está “ainda em curso e sem decisão definitiva” e que irá recorrer da decisão judicial que concedeu ao garoto a tutela antecipada. 

 



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