Invasões no Leite Lopes fazem Anac suspender voos noturnos

17/02/2018 08:36:00

Se a prefeitura e o governo do Estado não tomarem medidas para conter invasões até o dia 16 de março, até 22 voos noturnos poderão ser cancelados em Ribeirão Preto

 

 

 

Único lazer das crianças:"Não tem como segurar as crianças", diz Tereza Pereira, liderança comunitária do Jardim Aeroporto (foto: Weber Sian / A Cidade)

Devido às invasões de crianças em busca de pipas no interior do Aeroporto Leite Lopes, em Ribeirão Preto, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) proibiu, a partir do dia 16 de março, pousos e decolagens no período noturno. Se a prefeitura e o governo estadual não tomarem as medidas necessárias, até 22 voos diários podem ser cancelados.  

"A medida tem caráter provisório, sem prazo determinado, e será mantida até que o operador do aeródromo solicite revogação e demonstre implementação completa das ações" para correção dos problemas, cita a portaria com a proibição, publicada na edição de quinta-feira (15) do Diário Oficial da União. Ela entra em vigor daqui a 30 dias.  

Cabe ao Daesp (Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo) a operacionalização do Leite Lopes. O diretor regional, Álvaro Cardoso Júnior, diz que parte das exigências da Anac já foi realizada e garante que a proibição não será aplicada.  

"Não existe a hipótese de suspensão. Tomaremos todas as medidas necessárias de adequação antes do prazo, para revogação da portaria", afirmou Álvaro ao A Cidade.  

Ele diz que, no ano passado, foram registradas 73 invasões no Leite Lopes, das quais 70 ocorreram nos meses de janeiro, dezembro e julho, quando há férias escolares.

Brincadeira  

Crianças soltam pipa ao lado do aeroporto e pulam as grades de proteção quando o brinquedo, após ser "podado" em uma disputa, cai próximo à pista. Além do risco à integridade física delas e dos passageiros, a prática também causa atrasos de até dez minutos em pousos e decolagens.  

Ele diz que o Daesp já podou cerca de 200 árvores no ano passado, para evitar que sejam usadas para pular o alambrado, e que está em processo a implementação de cerca elétrica. Também instalou, no interior do aeroporto, um cercado duplo, ao custo de R$ 250 mil.  

A Anac, porém, exige que a prefeitura e o governo estadual também formalizem um pacto para atuação do poder público no entorno do Leite Lopes.  

"É uma questão social, não apenas de segurança. Não adianta atacarmos as consequência sem resolvermos as causas", diz Álvaro.  

O Jardim Aeroporto, colado ao Leite Lopes, está tomado por ocupações irregulares, e os moradores reclamam que a prefeitura não oferece nenhum equipamento de lazer para o bairro.   

 

 

 

LEIA MAIS: Leite Lopes ganha nova cerca para coibir invasão de menores

Aumenta ocupação ilegal ao lado da pista do Leite Lopes 

Um avião colide com aves a cada 13 dias no Leite Lopes 

Linhas prejudicadas  

Das 18h30 às 6h, o Leite Lopes registra pousos ou decolagens para São José do Rio Preto, Rondonópolis (MT), São Paulo (Guarulhos e Congonhas), Campinas, Brasília e Belo Horizonte (MG). Segundo Álvaro Cardoso Junior, diretor regional do Daesp, o período noturno é considerado o horário entre o pôr e o nascer do sol.  

Por que à noite?  

Todas as invasões no ano passado ocorreram pela manhã ou à tarde. Entretanto, a proibição de voos vale apenas para o período noturno. Questionada pelo A Cidade, a Anac enviou nota sem responder o motivo. Nos bastidores, a justificativa é de que à noite a visibilidade é menor e, principalmente, que a medida serve mais como um alerta ao Daesp para realizar as adequações necessárias. 

Medida visa providências  

Em nota, a Anac informou que a proibição se deu em razão da "não implementação de ajustes adicionais para redução da possibilidade de entrada não autorizada na área operacional" do Leite Lopes.  

Além disso, a Anac cita como um dos motivos a "não pactuação formal por parte da municipalidade e do órgão de segurança pública local de apoio às ações do operador de aeródromo", ou seja: a ausência de um convênio entre prefeitura de Ribeirão Preto e Daesp para a aplicação de medidas que inibam as invasões.  

"A Agência reitera a sua missão de garantir a todos os brasileiros a segurança e a excelência da aviação civil e informa que a medida restritiva poderá ser revogada quando o operador do terminal demonstrar a implementação completa das ações listadas na análise técnica que fundamentou sua aplicação". 

Outro lado  

Daesp e prefeitura discutem  

O diretor regional do Daesp, Álvaro Júnior, afirma que está em tratativas com a prefeitura para, nos próximos dias, cumprir a exigência da Anac de promover ações sociais conjuntas com o município junto às comunidades do Jardim Aeroporto.  

Questionada, a prefeitura confirmou, por meio de nota, que tem discutido com a direção regional do Daesp intervenções que possam ajudar na solução do problema. Também informou que a Secretaria Municipal de Assistência Social atende crianças cadastradas no programa Bolsa Família, no contraturno escolar, por meio do Cras (Centro de Referência de Assistência Social) e do Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social); e que discute a criação de uma força-tarefa do município, envolvendo vários órgãos, sob a coordenação da Defesa Civil.  

Sobre o prédio da BAC (leia à direita), a prefeitura disse que precisa reformá-lo para reabri-lo, pois está com sua estrutura totalmente danificada, mas não estipulou data ou prazo para fazê-lo.  

 

 

 

Acima, imagem do prédio da Base de Apoio Comunitário, antes de ser fechado, há quatro anos (foto: Google Street View)

 

 

 

 
Antigo espaço de segurança e lazer está abandonado 

Lideranças comunitárias ouvidas pelo A Cidade reclamam que a prefeitura não oferece opções de lazer para crianças e adolescentes do Jardim Aeroporto. Soltar pipa, assim, acaba sendo a principal e única opção para muitas delas.  

Antigo polo de segurança e oferta de serviços culturais e sociais, o BAC (Base de Apoio Comunitário) do bairro está fechado e abandonado há quatro anos.  

O prédio, localizado em frente à Unidade Básica de Saúde do Bairro, ao lado de uma escola municipal, está com todas as janelas quebradas e a fiação foi furtada. Após sucessivas invasões de sem-tetos e usuários de drogas, as portas foram soldadas. A calçada do local, porém, ainda é ponto de encontro de dependentes químicos.  

"Quando funcionava, o BAC era uma benção. Tinha judô, biblioteca, computadores, aula de dança... mas desde 2014 está abandonado", diz Tereza Pereira, 66 anos, atual presidente da Associação dos Moradores do Jardim Aeroporto.
Havia uma base fixa da PM no local, desativada, segundo Tereza, em 2012.  

"Aqui deveria atender crianças e idosos, ter aulas de dança, monitores de informática, caratê, assistente social. Nosso bairro está abandonado, não tem opção alguma da prefeitura aqui", diz Maria Imaculada Giangreco, 69 anos, que presidiu por cinco anos a associação de moradores do Jardim Aeroporto. 

 

 

 

Hoje a Base de Apoio Comunitário está abandonada (foto: Matheus Urenha / A Cidade)

 

 

 



    Mais Conteúdo