Secretário garante 'diálogo total' e critica populismo; especialista vê governo acanhado e ainda fala em letargia
A falta de diálogo está colocando o governo do prefeito Duarte Nogueira (PSDB) em uma rota de colisão com a Câmara de Vereadores. Pelo menos é o que alegam os parlamentares, inclusive os governistas. Já a prefeitura garante que há “diálogo total” e critica posturas populistas.
Há pouco mais de um mês à frente do Executivo, o tucano já coleciona cinco derrotas junto à Casa de Leis. A última ocorreu na terça-feira (7) quando os vereadores aprovaram, por unanimidade, um projeto de Decreto Legislativo que anula os efeitos do decreto de Nogueira que, no mês passado, reajustou em 15,53% a tarifa de água.
Durante a votação do projeto e no pinga-fogo, o tucano foi metralhado até por vereadores aliados.
De autoria do vereador oposicionista Jorge Parada (PT), o projeto aprovado considerou o reajuste “ilegal e imoral” por ser 9,24% acima da inflação do período de 12 meses fixado em 6,28%, além de não ter passado por análise do Conselho de Saneamento Básico, como prevê lei municipal.
Ao mesmo tempo em que defende a legalidade do aumento da tarifa, o prefeito não descarta revisá-lo, caso a Justiça o considere inconstitucional.
“A Prefeitura sustenta a decisão tomada pelo Daerp e ratificada por mim no tocante à recomposição da perda inflacionária da taxa de água. Confio na legalidade da decisão tomada e, se por ventura cometi algum erro, e a Justiça assim o decidir, imediatamente corrigirei”, frisou Nogueira.
A declaração do tucano evidencia o ingresso de uma ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) junto ao TJ-SP (Tribunal de Justiça) para tentar derrubar o decreto da Câmara.
Para o advogado especialista em administração Marco Aurélio Damião, o governo pode alegar “ofensa ao princípio constitucional da separação e independência dos Poderes”.
O número de derrotas de Nogueira junto a Câmara deve crescer entre hoje e a próxima semana com a votação de mais três projetos de decretos legislativos que miram outros decretos do chefe do Executivo.
Pelo visto a cordialidade entre os poderes se resumiu a visita feita pela Mesa Diretora. Na ocasião, Nogueira foi convidado para ir a sessão de anteontem, disse que iria “com prazer”, mas não compareceu.
Sessão lotada - Pressão dos servidores surte efeito
Para o vereador Jorge Parada (PT), a base governista só votou pela suspensão do decreto do prefeito Duarte Nogueira (PSDB) por pressão dos servidores, que lotaram a sessão da última terça-feira. “Votaram porque havia uma pressão muito grande. Nunca vi a Câmara tão lotada”, enfatizou. Para o presidente do Sindicato dos Servidores, Laerte Carlos Augusto, a Câmara tem se mostrado sensível e coerente com o compromisso de valorizar o serviço público e os servidores. “A palavra de ordem de todo o movimento sindical é nenhum direito a menos. E esse grito tem que ser levado para a sociedade toda”, ressaltou, emendando que “o governo abandonou o diálogo e decidiu violar ou ameaçar violar direitos consagrados dos servidores.
‘O Legislativo precisa ter juízo’
“O populismo quebrou o Brasil nos governos do PT e quebrou Ribeirão Preto nos governos do PSD. O Legislativo precisa ter juízo, a cidade está falida e quebrada e precisa de medidas duras. Os remédios amargos são os que muitas vezes curam as doenças”.
A declaração é do secretário de Governo, Nicanor Lopes, que tem entre as suas atribuições o diálogo com a Câmara. Nicanor, que também é presidente do PSDB Municipal, nega veementemente que faltem conversas com o Legislativo. “Eu recebo os vereadores aqui todos os dias. Tenho demanda dos 27. O diálogo é total”, frisa.
A opinião de Nicanor contrasta com a do vereador Bertinho Scandiuzzi (PSDB), um dos 27 parlamentares que votou pela suspensão do decreto de Nogueira que revisou a tarifa de água. “Não dá para defender o indefensável. Não houve explicação ou diálogo. Me senti sem direito e vontade de fazer qualquer defesa”, ressaltou.
Maurício Gasparini e Gláucia Berenice, ambos do PSDB, entendem que o decreto de Nogueira é ilegal por revisar período superior a 12 meses. “Está faltando diálogo, sim. Sem falar no aspecto social. Ninguém está pronto para um aumento de 16%. Tudo tem limite, deveria ser escalonado”, enfatizou Maurício.
Oposição vê desorganização na base governista
Para a oposição, falta organização entre o governo do prefeito Duarte Nogueira (PSDB) e sua base aliada. “Eu fiquei surpreso com a votação. Achei que seriam mais organizados, mas não indicaram nem o líder do governo até agora”, declarou o presidente da Câmara, vereador Rodrigo Simões (PDT). O chefe do Legislativo também critica a falta de diálogo. “Mandaram uma explicação sobre a tarifa depois que a decisão estava tomada e o decreto publicado no Diário Oficial. Aí não adianta”, alfinetou. O vereador Orlando Pesoti, líder do PDT, também se queixa de falta de diálogo. “Não é governando por decreto que se faz uma cidade”, frisou. Pesoti protocolou ontem, na Câmara, um projeto de decreto legislativo que prevê a suspensão do decreto de Nogueira que mudou a data de pagamento dos servidores do dia 30 para o 5º dia útil. “Essa mudança afeta a vida de milhares de famílias. Não houve diálogo nem com os servidores para que pudessem planejar suas contas”, lamenta.
‘Letargia pode prejudicar o município’
Ninguém governa sozinho. Ainda no ano passado, desenhada a configuração na nova Câmara, estava claro que o Executivo teria que ter muita habilidade para conseguir aprovar seus projetos. Com a necessidade de medidas que, mesmo sendo necessárias, são impopulares e podem servir como munição para a oposição, o trabalho fica mais difícil ainda. Me parece que o Executivo ainda está acanhado, tanto em relação à execução do plano para colocar a cidade nos trilhos - e isso requer maior diálogo entre os partidos que compõe o governo - quanto na relação com o Legislativo, que anda desconexa, desencontrada, mesmo com os vereadores da base, que são minoria. Por outro lado, as pessoas ainda não viram, na prática, as coisas acontecerem, e essa letargia pode prejudicar o crescimento da cidade e o humor dos eleitores. Mau sinal, pois o tempo está passando e a paciência dos cidadãos geralmente não dura muito. O que será que o Executivo terá para apresentar nos 100 primeiros dias de governo, além das sucessivas derrotas na Câmara?