Um 'ex-sócio' de Pablo Escobar em Ribeirão Preto

22/05/2017 15:36:00

Polícia norte-americana e PF descobrem que empresário da cidade é homem forte no narcotráfico mundial

Divulgação / Polícia Civil / Reprodução
Mário Sérgio, o goiano, era sócio do narcotraficante Pablo Escobar (foto: Divulgação / Polícia Civil / Reprodução)

 

Quem é o megatraficante Mário Sérgio Machado Nunes, que, aos 30 anos, assumiu o posto do ex-patrão no crime e que rapidamente alçou voo próprio ao ponto de ser um dos poucos homens no mundo a negociar a compra de cocaína diretamente do colombiano Pablo Escobar, no início dos anos 1990? 

Ninguém imaginava que, enquanto figurava na lista de investigados da DEA, departamento de narcóticos norte-americano, Mário Sérgio vivia em Ribeirão Preto, longe de qualquer suspeita, sob o manto de um fiel contabilista e empresário bem-sucedido.

LEIA MAIS
Justiça bloqueia R$ 100 milhões em bens de 'ex-sócio' de Pablo Escobar
Jornalista esquadrinha atuação de narcotraficantes por cinco anos
'Ex-sócio' de Pablo Escobar pagou US$ 20 milhões para construir submarino do tráfico
'Ex-sócio' de Pablo Escobar apostou na personalidade dupla para escapar da prisão

Por pelo menos quatro décadas, a cidade foi o porto seguro do homem que, desde 1996 era procurado por ter fugido de uma prisão em Cabo Verde, na África. Ele conseguiu escapar da prisão na ilha africana 30 dias depois de ser preso em flagrante num descarregamento frustrado de 70 quilos de cocaína e corromper funcionários do governo africano .

A história do capo do tráfico é uma das dissecadas no livro “Cocaína – a rota caipira”, do jornalista Allan de Abreu, lançado no início do mês pela Editora Record.

Com riqueza de detalhes pinçados de uma pilha de inquéritos e processos judiciais e num texto literário dinâmico, digno de roteiro de um bom filme de ação, Abreu retrata a eletrizante epopeia do traficante que conseguiu o inédito feito de atuar no tráfico internacional por pelo menos três décadas longe da balança da Justiça brasileira.

O homem que tem sido esquadrinhado pela DEA desde 1990, por sua forte atuação no mercado multinacional de drogas, até hoje não responde a nenhum processo criminal no Estado, mesmo tendo utilizado o Porto de Santos e o Aeroporto de Internacional de Guarulhos para escoar, por anos a fio, toneladas e toneladas de cocaína para a Ásia, África e Europa.

Sua primeira condenação criminal no País foi há 3 anos, no Maranhão. Mário Sérgio, segundo o delegado Alberto Pereira Matheus, do Denarc da Capital, entrou no crime no início dos anos 80 por intermédio de seu compadre e ex-patrão, Gilberto Yanes Cruz, um empresário e fazendeiro de Londrina, que se enveredou para o caminho do tráfico internacional.

Em 1985, Mário Sérgio, segundo o livro “Cocaína”, aparece pela primeira vez numa investigação da PF com a DEA que desvendou um megaesquema de tráfico que distribuía uma tonelada de cocaína por mês no Brasil comandado por Yanes e chefões do cartel de Medellín, na Colômbia.

Em fevereiro de 85, uma semana antes de a Operação Eccentric ser deflagrada, Yanes morreu num acidente aéreo no Paraguai, quando trazia 600 quilos de cocaína para o Brasil.

O próspero empresário de Ribeirão assumiria de vez o posto de patrão no arriscado, mas altamente lucrativo mercado internacional da cocaína.  

Reprodução / Interpol
Alerta da Interpol para a captura do traficante 'Goiano' (foto: Reprodução / Interpol)

 

Negócio ilícito rendia US$ 5 milhões por semana

A atuação da quadrilha liderada por Mário Sérgio era tão intensa que seu faturamento bruto girava em torno de US$ 5 milhões por semana.

Dinheiro que, segundo a DEA, estaria espalhado em contas de laranjas de várias partes do mundo como Dubai, Angola e Venezuela.

O mercado da cocaína lhe rendeu um patrimônio avaliado em US$ 70 milhões, segundo estimativa da Polícia Federal. Para não acumular riqueza em seu nome e despertar a atenção da polícia, dissolveu todo o patrimônio em nome de parentes.

Só em 1998, entraria de vez no radar da PF, com a deflagração da Operação Tornado que resultou na apreensão de 141 quilos de cocaína em Biriticupu, numa fazenda do traficante Leonardo Dias Mendonça, no Maranhão. Na época, cinco pessoas foram presas e denunciaram que droga fora adquirida por Mário Sérgio pelo valor de US$ 230 mil.

À época, a PF até tentou prendê-lo, mas ele conseguiu um habeas corpus que barrou sua prisão preventiva, mas não escapou do processo criminal.,

Só em 2014, após três anos de investigação da Operação Águas Profundas, a PF conseguiria, pela primeira vez, bloquear R$ 100 milhões em bens do empresário. Entre os 45 imóveis sequestrados pela Justiça está o Hotel Ideali, instalado em área nobre de Ribeirão Preto. A Justiça Federal decretou sua prisão e determinou a inclusão de seu nome no rol dos procurados da Interpol.

O delegado federal Bruno Gama, da PF de Goiânia, responsável pela operação, atribuiu a dificuldade de incriminar Mário Sérgio ao fato de ele operar apenas por intermédio de terceiros. “É um homem que só agia e dava ordens por intermédio de um forte secretariado.”

A ascenção e queda de Mário Sérgio

10/07/1956
Nasce Mário Sérgio Machado Nunes, em Olinda (PE)

DÉCADA DE 70
Muda-se para Ribeirão Preto

INÍCIO DA DÉCADA DE 80
Começa a trabalhar como contador para o fazendeiro Gilberto Yanes Cruz, homem que logo se tornaria seu compadre e um dos distribuidores de cocaína do cartel de Medellín, na Colômbia.

FEVEREIRO DE 1985
Gilberto Yanes morre na explosão de uma aeronave, quando transportava 600 quilos de cocaína para o Brasil. Há suspeitas de que a aeronave tenha sido sabotada. Mário Sérgio assume o lugar de Yanes no tráfico e passar a negociar cocaína direto com Pablo Escobar

DEZEMBRO DE 1996
Mário Sérgio é preso com 73 quilos de cocaína em Cabo Verde, África. Após 30 dias na prisão, corrompe funcionários do governo cabo-verdiano e foge do presídio pela porta da frente

JANEIRO DE 1997
Passa a trabalhar com o megatraficante Leonardo Dias Mendonça – apontado como um dos maiores da América Latina

1998
É rastreado levando cocaína escondida em turbinas de aviões da Colômbia para os estados norte-americanos do Texas e Ohio.

14 DE SETEMBRO DE 1999
Polícia Federal apreende 141 quilos de cocaína numa das fazendas de Leonardo Dias Mendonça em Buriticupu, interior do Maranhão. Cinco pessoas foram presas e uma delas denuncia que a droga é de Mário Sérgio.

2004
Mário Sérgio passara a transportar cocaína da Colômbia para o Suriname a serviço de José María Corredor Ibagué, o Boyaco, um dos líderes das Farc, responsável por uma rede de transporte aéreoda cocaína colombiana até a Venezuela, Suriname, norte do Brasil e México.

2007
Guarda costeira espanhola flagra um navio com 1,1 tonelada de cocaína. Para a DEA, a droga era de Mário Sérgio.

2010
Investe US$ 20 milhões na construção frustrada de um submarino na África, em parceria com o colombiano Henry de Jesús López Londoño,

2012
Monta base na Cidade do Panamá, onde faz contato com empresas de transporte marítimo do mundo todo e com cartéis da Colômbia e do México

2012
Janeiro de 2012, começa a negociar com engenheiros colombianos a construção de um novo submarino. Dessa vez, avaliado em US$ 3,5 milhões.

MAIO DE 2014
Acusado de tráfico internacional e associação para o tráfico, tem prisão preventiva decretada pela Justiça Federal de Goiânia em decorrência da Operação Águas Profundas e R$ 100 milhões em bens bloqueados e desaparece do mapa

SETEMBRO DE 2015
É preso no morro na saída de um condomínio de luxo no morro do Sorocotuba, no Guarujá, com o nome falso de Rogério Carvalho Fava

MAIO DE 2016
É transferido da Penitenciária de Mirandópolis para Goiás e, depois, removido para o Presídio Federal de Mossoró (RN)
 



    Mais Conteúdo