Após luta do bairro, parque será feito às margens do Retiro Saudoso

28/12/2015 14:36:00

Empreiteiras vão bancar construção de ciclovias, pistas de caminhada e plantio de árvores

Secretaria do Meio Ambiente / Prefeitura de Ribeirão Preto
Parque Retiro Saudoso terá 162 mil m² na Celso Charuri. A linha vermelha do projeto acima é uma pista de caminhada, que contará com ciclovia (Foto: Secretaria do Meio Ambiente / Prefeitura de Ribeirão Preto)

Notícia atualizada às 17h20*

A batalha é longa. Desde 2008, segundo diretores da Associação dos Moradores do Jardim Roberto Benedetti (Amojarb), a população tenta transformar a área verde abandonada às margens do córrego Retiro Saudoso, na avenida Celso Charuri, em um espaço de uso realmente público. A espera, porém, compensou: o pedido inicial por calçadas e pista de caminhadas foi transformado em um projeto de parque de 162 mil m².

“Essa área sempre foi um depósito de lixo e de entulho, justamente pela falta de cuidados da prefeitura”, diz Gil Santiago, diretor da Amojarp. No mês passado, porém, o cenário começou a mudar, com o início das obras de limpeza e terraplanagem do local. Tinha início, enfim, o Parque do Retiro Saudoso.

Ele será totalmente custeado pela iniciativa privada, principalmente por quatro empreiteiras, devido às cobranças de compensação ambiental feitas pela Secretaria do Meio Ambiente. “Em vez de apenas plantarem árvores, pedimos que fosse feita a infraestrutura do local”, explica o secretário do Meio Ambiente, Daniel Gobbi.

O Parque terá ciclovias, pistas de caminhada e ampla arborização. A prefeitura tenta viabilizar, agora, o pagamento de uma multa aplicada a um empreendimento para custear quiosques e sanitários. O valor, de aproximadamente R$ 1 milhão, está em fase final de negociação por meio de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o Ministério Público.

Milena Aurea / A Cidade
Gil e Suzana exaltam a pressão dos moradores junto à prefeitura para revitalizar área na Celso Charuri (Foto: Milena Aurea / A Cidade)

“Podemos dizer que, finalmente, a prefeitura abraçou de verdade a nossa causa e está dando todo o apoio”, diz Suzana Busatto, vice-presidente da Amojarp. Casados, ela e Gil moram no bairro há 25 anos e já presenciaram, até, incêndios na área.

No local, o A Cidade constatou entulhos acumulados e até sacolas nas margens do Retiro Saudoso.

“Além de ser um espaço de lazer para toda a população, o Parque irá preservar o meio ambiente. Por isso lutamos tanto por ele”, diz Gil.

A execução do parque foi dividida em três fases. A primeira, de 82 mil m², estará concluída no início do segundo semestre, segundo a secretaria do Meio Ambiente. Com exemplos de abandonos e atrasos, a população promete fiscalizar os prazos de perto.

Obstáculos

Se fosse inaugurado hoje, os visitantes teriam dificuldades para chegar ao futuro Parque do Retiro Saudoso. A rua Maria Bariza, que contorna a área, tem alguns trechos com mais buracos do que asfalto. Em cinquenta metros, o A Cidade contou 24 crateras abertas, no cruzamento com a rua Benedito Tórtoro.

Rubem Cione invadido

“Inaugurado” incompleto na gestão Welson Gasparini (PSDB) em 2008, o Parque Rubem Cione passou sete anos da gestão Dárcy Vera (PSD) sem ser aberto à população. Este ano ele foi invadido por famílias sem teto e a prefeitura teve que pedir a reintegração de posse. Segundo o Palácio Rio Branco, em 2016 serão feitas obras de calçadas e cercamento e o local será revitalizado para, enfim, ser utilizado pela população.

Zona Sul concentra novos parques

Os quatro novos parques estão localizados na zona Sul ou proximidades dela.

F.L. Piton / A Cidade
O parque na Nova Aliança tem 70 mil m² e será revitalizado pela iniciativa privada. Segundo a secretaria do Meio Ambiente, ele ficará pronto no primeiro semestre de 2016 (Foto: F.L. Piton / A Cidade)

O professor da USP e especialista em Política Ambiental, Marcelo Pereira de Souza, alerta para a elitização dessas áreas e para a necessidade de democratizar o acesso. “A regra, em Ribeirão Preto, é que as áreas verdes sejam privatizadas e restritas”, diz.

Segundo José Roberto Bonetti, diretor do departamento de Gestão Ambiental da secretaria do Meio Ambiente, a prefeitura está atenta à concentração na zona Sul - que ocorre, justamente, porque os novos empreendimentos estão lá localizados.

“Estamos estudando mudanças na legislação para facilitar que as demais áreas verdes também sejam beneficiadas”, diz.

Parque Nova Aliança receberá R$ 2,5 milhões

O parque Nova Aliança, localizado ao lado do Ribeirão Shopping, está com o cronograma inicial atrasado. Em contrapartida, o investimento que a empresa Multiplan realizará passou de R$ 2 milhões para R$ 2,5 milhões.

Em junho, quando foi anunciada, a revitalização do parque – que conta com três lagos – tinha o término previsto para até o Natal. Mas o projeto, segundo a empresa, sofreu modificações – para melhor. Ele ganhará agora sanitários e uma área administrativa.

Com 70 mil metros quadrados, o parque terá uma pista de corrida de 1,6 mil metros de extensão, além de arborização completa com palmeiras, ipês, primaveras, azaleias, jasmins e lobélias. A manutenção ficará a cargo da iniciativa privada e ainda não há prazo de conclusão.

Secretaria do Meio Ambiente / Prefeitura de Ribeirão Preto
R$ 5,5 mi é o valor investido pelas empreiteiras para o Parque Sul, que irá valorizar os imóveis e será aberto à toda população (Foto: Secretaria do Meio Ambiente / Prefeitura de Ribeirão Preto)

‘Não pode ficar tudo para a prefeitura’

“Os empreendedores precisam se unir. Não adianta deixar apenas nas costas do poder público, que sofre com a falta de recursos”. Para Fernando Junqueira, diretor regional do Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção Civil), esse é o caminho para melhorar a qualidade de vida dos ribeirão-pretanos.

A empresa do qual ele é diretor está construindo, em parceria com outra empreiteira, o Parque Sul, localizado no Jardim Irajá. Com 18 mil metros quadrados, o local contará com desde mirante e espelho d´ água a bebedouro para animais.

“Será o primeiro Parque Design do Estado de São Paulo, com inspirações no exterior, com funcionamento 24 horas e totalmente aberto ao público”, diz Fernando.

O Parque será construído na área verde que seria destinado à prefeitura pela construção do conjunto de dez torres que será feito ao lado, e a manutenção será totalmente da iniciativa privada.

O investimento inicial só para o parque é de R$ 5,5 milhões. Para efeito de comparação, isso é 65% do que a secretaria do Meio Ambiente tem de recursos próprios para todo o ano de 2016. Enquanto os moradores do empreendimento terão um “jardim de luxo” e os imóveis serão valorizados, a população de Ribeirão ganha um novo espaço de lazer.

“Todos saem ganhando”, explica Fernando. A construção já iniciou e a entrega está prevista para o primeiro semestre de 2017.

Mastrangelo Reino / A Cidade
Parque Público no fundo do empreendimento terá 140 mil metros quadrados (Foto: Mastrangelo Reino / A Cidade)

Ele diz que as contrapartidas previstas em lei da iniciativa privada ao poder público durante a construção dos empreendimentos precisam dar um retorno direto à população.

“Não adianta apenas ceder área institucional para a prefeitura, que muitas vezes acabam sem finalidade. É preciso avançar, passar a entregar creches e postos policiais, por exemplo”.

Lei de 2002 possibilitou ‘parceria’

Para viabilizar um empreendimento residencial no prolongamento da avenida João Fiúsa, a Prefeitura de Ribeirão Preto exigiu que fosse construído um Parque Linear e que a área, de 140 mil metros quadrados, fosse doada ao município.

A principal base legal foi a Lei Complementar nº 1320, aprovada em 2002 na gestão de Antônio Palocci (PT), que possibilita a entrega de equipamentos comunitários para compensar taxas exigidas para a aprovação de loteamentos.

O parque terá o nome de “Olhos d´ Água Nuncia Romano” e estará dentro de um condomínio residencial. “Estará cercado, mas qualquer um poderá usufruir, seja morador ou não do condomínio”, explica o secretário do Meio Ambiente, Daniel Gobbi. A construção, diz, deve começar em fevereiro e durar um ano.

Análise>>>Necessidade de alerta

As áreas verdes públicas sofrem há muito tempo, inclusive antes da atual gestão, um completo abandono da Prefeitura de Ribeirão Preto. A zona Leste, por exemplo, tem mais de 1 milhão de metros quadrados de áreas verdes sem implementação. É necessário ficar extremamente atento a esse modelo de privatização dessas áreas. A regra no município é que esses locais, que deveriam ser públicos e de livre acesso à população, se tornam particulares e restritos, como ocorre no Royal Park, por exemplo. Na avenida João Fiúsa, há jardins que são áreas verdes públicas mas que se tornaram exclusivos dos moradores. Eu mesmo já fui expulso ao sentar lá. Assim, há muitos loteamentos fechados que possuem áreas verdes em seu interior, o que é totalmente ilegal. Não é uma coincidência que esses novos parques estejam todos localizados na zona Sul, pois lá estão os principais interesses imobiliários. Precisamos ser claros: esses parques são implementados, sobretudo, para valorizar esses empreendimentos. Justamente por isso, é preciso ficar em alerta para que, no futuro, eles também não se tornem restritos.

Marcelo Pereira de Souza, professor de Política Ambiental da USP

*O título da notícia, que citava o parque no Jardim Roberto Benedetti, foi atualizado



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