Bafômetro flagra 15 motoristas embriagados por dia na região de Ribeirão Preto

01/09/2014 09:28:00

Números são menores do que nos dois anos anteriores, mas dor das vítimas dos motoristas embriagados não diminui

Arte / A Cidade

 

Por dia, cerca de 15 motoristas foram pegos alcoolizados em Ribeirão Preto e região, de janeiro a julho deste ano, segundo dados da Polícia Militar. Os números são de um levantamento interno do Comando de Policiamento do Interior (CPI-3) e refere-se às ocorrências dentro dos 93 municípios da região.

Foram 2.231 Autos de Infração confeccionados com base no artigo 165 do CTB (Código de Trânsito Brasileiro), que prevê infração de trânsito por dirigir sob influência de álcool ou substância psicoativa, quando o bafômetro acusa de 0,05 a 0,33 mg/l (miligrama de álcool por litro) de ar alveolar; e 957 flagrantes pelos artigo 306 do mesmo código, que prevê Crime de Trânsito, quando o bafômetro acusa a partir de 0,34 mg/l de ar alveolar.

Os números assustam, mas são melhores do que os apurados em 2013, quando o total de ocorrências no mesmo período foi de 4.097. Houve uma redução de 16,9% nas ocorrências pelo art. 165 e menos 32% de ocorrências pelo art. 306.

Embora não digam respeito apenas aos acidentes envolvendo motoristas embriagados, os números da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo também são otimistas, uma vez que acusam 27 homicídios culposos por acidente de trânsito, de janeiro a julho deste ano, sete a menos que no mesmo período do ano passado, e dois homicídios dolosos por acidente de trânsito, igual ao ano anterior.

Apesar da queda nas estatísticas, esses números nunca são positivos, uma vez que a imprudência no trânsito, sobretudo a que combina álcool e direção, continua vitimando milhares de pessoas.

Caso da família dos Santos, que perdeu a Vilma Aparecida dos Santos, 49 anos, e a neta caçula dela, Doane Aparecida dos Santos, 8 anos, no dia 19 de julho, devido a um acidente causado por motorista assumidamente embriagado e sob efeito de cocaína.

“Pelo amor de Deus, moço, fala que minha mãe está viva’. Eu subi na porta da ambulância e do vidro vi os médicos tentando reanimá-la, mas não deu”, lembra Rosângela Aparecida dos Santos, 32 anos, com os olhos cheios de lágrimas. do dia em que presenciou a morte de sua mãe, Vilma, e de sua sobrinha, Doane.

As duas morreram no acidente causado por Mateus José Andrade, 37 anos, que dirigia uma Touareg a mais de 150 km/h na avenida Luzitana, num trecho cuja velocidade máxima é de 60 km/h. No local, ele confessou estar bêbado e ter consumido cocaína.

Milena Aurea / A Cidade
Claudineia e Rosângela observam veículo onde estava Vilma e a neta dela de oito anos (Foto: Milena Aurea / A Cidade)

Naquele sábado, Vilma estava de folga do serviço, onde trabalhava como balconista, e pegou a neta Doane para irem ao assentamento onde a família construía um barracão para um dos filhos morar. Tudo muito simples, mas cheio de união e alegria, características da família do Jardim João Rossi. Antes, as duas foram comprar acessórios de natação para a menina, que ia começar as aulas na semana seguinte.

“A Dodô [como era chamada pela família] era uma criança esperta, inteligente e cheia de vida. Não tem um dia que meu filho não pergunte dela”, comenta a tia da vítima.

Depois do dia de trabalho intenso, a família já tinha combinado que o almoço de domingo seria em um pesqueiro, para comemorar o aniversário do filho mais velho. A avó e a neta voltavam para casa no Corsa branco da família, quando por volta das 22h foram atingidas pela Touareg e os planos foram interrompidos.

“Como eu vou viver sem minha filha?”, pergunta a mãe de Doane, Claudineia Aparecida dos Santos, que está recebendo acompanhamento psicológico e administrada o trauma com medicamentos e apoio dos irmãos.

Além da dor da dupla perda, a família questiona quem pagará pelos prejuízos, como o carro que ficou completamente destruído e ainda está na garagem do condomínio por não ter condições de ser recolhido – para isso, a documentação deste ano, que não estava vencida, precisa ser paga. Sem contar nos custos com funeral.

F. L. Piton / A Cidade
Bafômetro ainda flagra muitos dirigindo embriagados (Foto: F. L. Piton / A Cidade)

PM destaca ações feitas

A Polícia Militar ressalta que norteia o policiamento preventivo regularmente em locais com maior incidência criminal, visando proporcionar maior sensação de segurança e reduzir ocorrências relacionadas ao trânsito.

Em nota à imprensa, também afirma que continuará realizando, em Ribeirão Preto, as operações ODSI (Operação Direção Segura Integrada), principalmente em regiões estratégicas onde há maior acúmulo de locais frequentados por pessoas que consomem bebidas alcoólicas ou usam substâncias psicoativas, como bares e boates. Para isso, vem contando com reforço em seu efetivo diário.

Interessados, podem procurar pelo Curso de Conscientização no Trânsito promovido pela PM, disponível na internet. E como lembrar nunca é demais, se beber, não dirija.

Motorista é solto e decisão revolta família de vítimas

“Não dá pra entender como menos de um mês depois o motorista está solto. Gostaríamos que ele esperasse o julgamento na cadeia”, diz Rosângela com indignação.

O empresário Mateus José Andrade, que estava preso no Centro de Detenção Provisória de Ribeirão Preto desde o dia do acidente, foi solto na noite de 14 de agosto por força de um habeas corpus concedido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e vai responder ao processo em liberdade.

Segundo a desembargadora Angélica de Maria Mello de Almeida, apesar da comoção gerada pelo crime, o homem tem direito a responder em liberdade por ter residência e empregos fixos e não possuir antecedentes criminais. Ele ainda deve se apresentar mensalmente à Justiça, não pode sair da cidade sem pedido antecipado e está proibido de dirigir sob qualquer circunstância.

Além dos pedidos indenizatórios, o advogado das vítimas está entrando como assistente de acusação junto com o Ministério Público, que denunciou Mateus por duplo homicídio qualificado, uma vez que assumiu o risco de provocar o acidente. Com isso, ele deve ir a júri popular. O processo corre em segredo de justiça.

Especialista diz que situação é muito complexa

Para o advogado Thiago Coletto, especialista em legislação de trânsito, casos como o relatado acima são muito complexos e precisam ser cuidadosamente avaliados sob dois aspectos: os desdobramentos criminal e cível e se o crime é culposo ou doloso.

A repercussão criminal possui um caráter pedagógico de mostrar para toda coletividade que determinado comportamento não pode ser tolerado, como dirigir embriagado. Já o aspecto civil visa garantir e proteger os interesses da vítima e de seus familiares, obrigando o causador do acidente repará-los economicamente.

“Apesar do clamor social que pede a prisão imediata do acusado, é preciso ponderar que pode ser melhor que ele esteja em liberdade, desde que esteja contribuindo para diminuir os prejuízos econômicos das vítimas.”

Ainda com relação ao aspecto criminal, é preciso estabelecer se houve dolo, quando há vontade inegável de matar a vítima, ou culpa, quando o acusado, apesar de responsável por seus atos, não deseja que resultassem em morte. Em julgamento recente, o Supremo Tribunal Federal entendeu que o mero fato do condutor estar embriagado, não induz, automaticamente, ao homicídio doloso, necessitando apurar, caso a caso, se houve dolo ou culpa.



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