Famílias temem despejo iminente em Ribeirão Preto

14/12/2017 08:48:00

Ao todo, 250 famílias vivem hoje na favela alvo de reintegração de posse há mais de seis anos

Weber Sian / A Cidade
Zildir Gonçalves de Souza, 50, chegou a Ribeirão vinda de Minas Gerais (foto: Weber Sian / A Cidade)

 

Zildir presenciou, há quatro meses, os R$ 30 mil que investiu na casa de alvenaria na Favela do Campinho, no Jardim Aeroporto (zona Norte), irem ao chão, após a destruição motivada pela reintegração de posse. Juliana também teve a casa de alvenaria destruída, voltou para um barraco de madeira e agora luta para comprar um terreno. Elizabete, por sua vez, não desiste do sonho de ser contemplada com a casa própria.

Em comum, as três mulheres habitam hoje a Favela da Família, no Jardim Aeroporto (zona Norte), palco da violenta reintegração de posse ocorrida há pouco mais de seis anos. E colecionam decepções, como o fato de ainda não terem conquistado um lugar digno para morar, bem longe do temor do despejo iminente.

Hoje já existem cerca de 250 famílias vivendo na favela, número já superior às 230 famílias que estavam no local há seis anos. A área invadida é particular, o que motivou a reintegração de posse em 2011.

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A dona de casa Zildir Gonçalves de Souza, 50, chegou a Ribeirão vinda de Minas Gerais logo depois da retirada das famílias e ocupou o terreno ao lado, a Favela do Campinho. Mas como se trata também de área particular, a reintegração de posse já ocorreu há quatro meses.

“Vendi minha casa em Minas e comprei uma casa no Campinho por R$ 20 mil, daí gastei mais R$ 10 mil em reforma. Perdi tudo, derrubaram tudo e só recebo R$ 880 por mês. Dá medo de tirarem a gente daqui, mas não tenho condições de pagar aluguel”, diz.

O que recebe por mês é por conta do filho que tem anemia falciforme, Josse. Foi por ele que Zildir saiu de Divisa Alegre (MG) para Ribeirão, há pouco mais de seis anos.

“Lá não tinha tratamento para ele, vim para cá no Hospital das Clínicas e de 15 em 15 dias ele faz transfusão de sangue”, explica. A solução para evitar que seu filho vá tanto ao hospital, segundo a mãe, é o tão sonhado transplante de medula.

“Meu filho mais velho fez o exame e é compatível, é possível fazer a doação”, diz, esperançosa. A mãe relembra com tristeza que Dhone, 24, no entanto, está preso há sete meses acusado de roubo.
Mas é possível, segundo a lei, que a Justiça autorize a saída temporária do irmão mais velho para doar a medula ao irmão caçula. 

Juliana quer casa própria em dois anos

A faxineira Juliana Andresa Almeida, 24, está contando os dias para realizar o maior sonho da família: comprar um terreno e construir a casa própria. “Espero que em dois anos esse sonho se torne realidade”, afirmou.

A empolgação tem motivo: o marido de Juliana está em um emprego registrado há pouco mais de um mês, em uma empresa de carga e descarga. E ainda há um complemento de renda das faxinas que Juliana faz.

“Essa vida de incerteza cansou. Não quero passar pela mesma experiência pela terceira vez. Dá medo de não saber como será o dia de amanhã”, declarou. A família de Juliana foi retirada à força da Favela da Família, em julho de 2011. Seis anos depois, em agosto deste ano, foi obrigada pela Justiça a deixar a Favela do Campinho. Ela havia gasto R$ 3 mil para construir dois cômodos de tijolos. 

“Agora vamos deixar só na madeira, porque esse dinheiro que investi foi todo jogado no lixo”, conclui Juliana, referindo-se à destruição das moradia de tijolos destruída após a reintegração de posse no Campinho.

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Juliana Andresa Almeida, 24, quer comprar uma casa dentro de dois anos; veja mais fotos na galeria (foto: Weber Sian / A Cidade)

 

Elizabete não perde a esperança

A auxiliar de restaurante Elizabete de Lima, 38, declarou estar na fila da casa própria há seis anos, mesma época em que foi despejada da Favela da Família. De lá para cá, a esperança de ser sorteada nunca foi perdida. “Daí eu vou estar pagando algo que é meu”, diz.

O barraco de madeira de Elizabete foi o primeiro que destruíram na reintegração de posse em julho de 2011. “Foi tudo para uma fossa, meu cachorro morreu e saímos com a roupa do corpo, nem documentos consegui recuperar.”

Ela e os cinco filhos, na época, foram morar na casa da mãe de Elizabete em outra favela próxima da zona Norte, na rua Pindorama. “Fiquei lá quase um ano e depois aluguei uma casa no Salgado Filho”, relembra.

Tendo de criar cinco filhos e ganhando R$ 870, a auxiliar de restaurante não conseguia mais bancar o aluguel de R$ 550. “Foi quando voltei para a Favela da Família, em julho de 2016.”

Elizabete vive hoje com três filhos e um auxílio doença de R$ 937. E com o mesmo temor de ser obrigada a deixar o local do dia para noite. 

Pagou R$ 3,5 mil pela casa de tijolos, mas quando chove é água entrando por tudo quanto é lado. “As telhas estão furadas, tem dia que não dá para se esconder em nenhum lugar quando chove muito”, conclui.

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Elizabete de Lima, 38, foi despejada da Favela da Família há seis anos e diz estar na fila para compra de uma casa própria; veja mais fotos na galeria (foto: Weber Sian / A Cidade)

 

Prefeitura cadastra famílias

A prefeitura confirmou que a área invadida pelas famílias é de propriedade particular. “A única medida que pode ser executada pelo poder público municipal é o cadastramento das famílias em programas habitacionais municipais”, declarou.

A administração acrescentou que na região do aeroporto há um local público invadido e que está tramitando o processo de reintegração de posse na Justiça. Desde o início do ano, a prefeitura cumpriu quatro reintegrações de posse determinadas judicialmente.

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