Contra o assédio, mulheres criam site 'chega de fiu-fiu'

05/10/2015 14:17:00

Mapa interativo busca rastrear locais dos assédios no país; em 1 ano, plataforma soma mais de 2 mil registros

Matheus Urenha / A Cidade
Aline Rosado, dona de agência de modelos, diz que mulher bonita sofre preconceito: ‘acham que ela não pode ser inteligente’ (foto: Matheus Urenha / A Cidade)

O grupo feminista Think Olga criou um mapa interativo com o objetivo de rastrear os locais onde as mulheres são assediadas. Pelo site chegadefiufiu.com.br as mulheres vítimas de machismo podem relatar o fato e marcar o local exato onde ocorreu.

Em um ano, a plataforma já soma mais de dois mil registros. Em Ribeirão Preto, são 10. Mulheres contam que são assediadas todos os dias, com palavras grosseiras, passadas de mão, atos obscenos.

“O homem não vê isso como algo agressivo. Vê como parte do jogo. O que no obriga a ouvir esse tipo de elogio cretino, sempre voltado a nossa beleza e não à inteligência”, diz Maria Berenice.

Aline Rosado, 29 anos, sabe bem. Foi dançarina, modelo e hoje é dona de uma agência de modelos. “A mulher bonita e independente sofre preconceitos. Eles acham que se ela é bonita não pode ser inteligente”.

Ela busca “se posicionar”, em suas palavras. “Costumo colocá-los no lugar deles, de forma educada”.
Maria Berenice defende a queda da “cultura da beleza”. “As mulheres precisam mudar a postura, não fazendo uso de seus atributos femininos de maneira a incentivar que os homens façam o mesmo”.
A mulher deve se vestir para si mesma. “Elas expõem o corpo não para consumo próprio, mas como atitude sexualizada”.

Berenice frisa, porém: “Nada disso justifica as atitudes dos homens. Mas é uma licença. Elas atribuem à estampa externa sua capacidade de sedução. Não apostam nelas mesmas”.

Novamente, destaca: nada justifica atitudes machistas e violentas. “Foi estuprada? Mas que roupa estava? Esse pensamento é absurdo. Ela foi até a vontade dela. Essa leitura eles não fazem. Querem ir além, para não darem a entender que não são fortes o suficiente”.

No canteiro de obras, luta é diária

Desde pequena, Aline Alves quis ser arquiteta. Na escola, surpreendia os coleguinhas, que estavam longe de saber o que era arquitetura. “Todo mundo se espantava quando eu dizia. Eles queriam ser médicos, professores”. 

Terminou e colegial e foi direto para a faculdade. Se formou aos 22 anos e não demorou a perceber qual seria o maior desafio da profissão. “Fui regularizar um imóvel, logo depois de formada. O dono era um senhor. Olhou pra mim e disse: ‘Você é arquiteta? Tem certeza?’. 

Quando começou a coordenar obras, travava batalhas diárias. A maioria dos funcionários na construção civil é homem. “Eu pedia para fazer de um jeito, chegava no outro dia e eles tinha feito completamente diferente. Não me davam atenção”. 

Foi preciso muito jogo de cintura. “Eu tive que aprender a conversar. Eles me apresentam o ponto de vista deles, eu apresento o meu e eles entendem o que estou pedindo. Tem que ser. Não admitem ser coordenados por uma mulher”. 

Quando o diálogo não resolve, porém, ela se faz respeitar. Já demitiu funcionário no meio da obra por falta de respeito. “Eles precisam parar de pensar que a mulher não sabe de nada. Em alguns momentos, preciso me impor para não perder o controle”.  



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