Santa Lydia gastou R$ 600 mil em sistema usado só por dois meses

04/03/2015 10:08:00

Fundação trocou sistema do hospital na véspera de intervenção de forma 'abrupta' e sem preservar dados

Matheus Urenha / A Cidade
Interventores decidiram desinstalar sistema do Hospital Santa Lydia por queda no faturamento (fotos: Matheus Urenha / A Cidade)

A Fundação Santa Lydia gastou R$ 600 mil com um sistema de informação que foi desativado com pouco mais de dois meses de uso por incompatibilidade com o sistema contábil e administrativo da instituição.

Metade desse valor ainda não foi pago, somando-se à dívida milionária da instituição em crise. A comissão interventora, que atua na Fundação a pedido da Justiça, tenta, agora, rescindir o contrato, conforme o A Cidade apurou.

A implantação do novo sistema foi feita no dia 1º de novembro de 2014, 19 dias antes de a Justiça determinar a intervenção na Fundação, em meio à demissão de profissionais por falta de pagamento e afastamento do superintendente da Fundação. Módulos, porém, não foram implantados corretamente.
A Contabilidade da instituição, que tem programa próprio, não se comunicava com o novo sistema, o que fez com que o banco de dados deixasse de ser alimentado a partir dessa data.

Além disso, o faturamento dos procedimentos realizados não era jogado no sistema de maneira adequada, causando “diminuição dos processos de cobrança enviados para as operadoras de saúde”.

A transação foi apontada por relatório dos interventores, em auditoria, como uma das causas da queda no faturamento da Fundação. Além disso, aponta o documento, houve grande dificuldade em recuperar informações financeiras e administrativas da instituição.

De acordo com a auditoria, os antigos gestores da Fundação decidiram implantar o novo sistema de maneira “abrupta”. “Implanta-se o novo sistema desligando o sistema antigo”, informa trecho o relatório.
Os interventores afirmam que “não foram encontrados os critérios utilizados” para a escolha da empresa e da troca do sistema, considerando que o sistema usado anteriormente pelo hospital tinha as mesmas funções do novo.

Durante dois meses, além do gasto com a nova plataforma, a Fundação também custeou a manutenção da antiga, com valor de R$ 6 mil mensais, conforme o A Cidade apurou.

Mediante esse cenário, a solução encontrada pelos interventores em janeiro foi retomar o sistema antigo como maneira de tentar recuperar os dados e o faturamento perdido.

‘O fator limitante para dar certo é o tempo’

O professor Claudio de Souza Miranda, da Faculdade de Economia e Administração de Ribeirão Preto (FEA/USP), pesquisador na área de sistemas de informação, explica que toda mudança de sistema deve ser feita aos poucos. 

“É indicado deixar os dois programas atuando paralelamente até ter segurança de que o novo sistema está bem implantado”, explica. Quando essa recomendação não é seguida, ele afirma, é comum que a empresa tenha problemas e precise recorrer ao sistema antigo. 

O professor informa  ainda que só é indicado a troca de um sistema para a obtenção de melhorias. “Você não pode trocar seis por meia dúzia”. 

E diz que o processo de implantação de um novo sistema pode se alongar por meses. “Depende do tamanho da empresa e do sistema. O fator limitante para dar certo é o tempo”. 

Presidência foi alertada dos riscos da mudança

O relatório frisa que a presidência da Fundação foi alertada pelos funcionários do hospital sobre os riscos da mudança “abrupta” do sistema de informação. 

O documento ainda constatou que o novo sistema, da empresa MV, atendia os mesmos requisitos do antigo. Foi apontado também que “vários módulos” do sistema antigo “não eram utilizados por falta de treinamento”. 

Os interventores optaram por retomar o sistema antigo, considerando todo esse cenário, e também pela necessidade de ter acesso às informações para a auditoria contábil. Os dados referentes a novembro, dezembro e anteriores a 10 de janeiro, quando o sistema antigo foi retomado, estão sendo redigitados. 

Questionada, a empresa MV não deu informações sobre o contrato com o Santa Lydia, seus valores, ou as providências que irá tomar em relação à dívida. 

Em nota, a empresa informou que “compreende as dificuldades enfrentadas e buscará, junto com a nova administração, uma solução que resguarde os interesses de ambas as partes”.



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