Banheiro público do Hortênsias vira o lar de Cida

17/04/2014 10:19:00

Ela coleta material reciclável para viver e cria gatos e cachorro na moradia 'improvisada' há 2 anos

Mateus Rigola/Tribuna Impressa
Cida encontrou cama na rua e aos poucos foi montando sua casa em banheiro

A catadora de materiais recicláveis Valdenice de Fátima Ribeiro, de 41 anos, não tem casa nem emprego fixo, mas isso não a impede de ter um “lar”. Há dois anos, ela mora no banheiro público do Jardim Hortênsias. O espaço deveria ser um vestiário para atletas, mas o campo de futebol que seria construído no terreno nunca saiu do papel.

Valdenice, ou Cida, como é conhecida no bairro, tem cinco filhos, mas não os vê há muito tempo. “Larguei do meu marido porque ele me batia muito. Meus filhos eram pequenos ainda, eles nem sabem que estou morando aqui”, relata, em entrevista à Tribuna Impressa. Ela não sabe ler nem escrever e sua única renda vem da venda dos materiais recicláveis.

“Antes de eu vir morar no banheiro, o lugar era cheio de viciados, ninguém cuidava, estava abandonado. Agora, eu pelo menos cuido, limpo, mantenho sempre arrumado. Os vizinhos gostam de mim”, conta. Cida também costuma limpar a casa dos moradores do Hortênsias. “Eles me pagam R$ 10, R$ 20, depende do dia. Já ajuda muito”, completa.

Rotina
Até um mês atrás, ela tinha água encanada na sua casa improvisada e conseguia tomar banho normalmente, limpar o espaço e dar água a seus animais de estimação, dois gatos e um cachorro. “Um vereador veio aqui ver a área que vai ser um campo de futebol. Acabaram quebrando o registro d’água e agora não posso tomar banho. Pego água com os vizinhos e na rua”, diz.

O banheiro tem “cara” de casa, com ursos de pelúcia d ecorando o ambiente, uma cama com colchão, quadros e tapetes. “Peguei tudo na rua. Já achei até uma televisão funcionando. Mas uns malandros entraram aqui, me bateram e levaram tudo o que eu tinha. Agora estou procurando outra, mas sempre que acho alguma está quebrada.”

“Sempre entram aqui, roubam os fios e tenho que arrumar tudo. Todo dia eu tenho que comprar uma lâmpada porque a molecada entra aqui e rouba a minha”, lamenta.

Sonhos
Cida sabe que não pode morar no banheiro para sempre. “Aqui é perigoso, sempre me roubam, às vezes batem em mim. Não entendo sobre meus direitos, mas fui uma vez no Cras [Centro de Referência de Assistência Social] aqui no bairro e disseram que iam me ajudar. Mas nunca fizeram nada”, diz.

O sonho dela é conseguir um emprego, ter um salário fixo e poder morar em um lugar melhor. “Não vou mentir para você [repórter], eu fumo crack. Mas quero parar, com a ajuda de Deus eu vou parar. Quando fico trabalhando o dia inteiro eu não tenho vontade. Quando assisto televisão também. Mas é difícil, estou há três dias sem fumar”, emociona-se.

Solidão
Cida mora sozinha, suas únicas companhias são os animais de estimação. “Eles apareceram aqui e não quiseram mais ir embora. Compro comida para eles, dou água, cuido, são minhas companhias”, diz.

Ela evita pedir dinheiro ou comida na rua. “Pago R$ 5 o prato de comida aqui perto. Quando não tenho dinheiro, eu peço para os vizinhos”, finaliza.

Outro lado

Prefeitura diz que Cida recusou atendimento

Procurada pela Tribuna, a Prefeitura informou que Valdenice apresenta um quadro de dependência química. “A Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social, em conjunto com a Secretaria da Saúde, já ofereceu acompanhamento no Caps-AD, que foi recusado. A cidadã tem residência no Hortênsias e possui família. A Secretaria de Assistência Social já orientou a família sobre as alternativas para realização de tratamento por meio da Justiça, como a internação compulsória, mas esta é uma decisão que cabe à família. A secretaria reitera que presta a assistência à mulher, e que inclusive está providenciando toda sua documentação pessoal”, diz a nota. 



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