Israel encontra na música a arma contra o autismo

17/05/2018 12:45:00

Criança de 11 anos, que também perdeu a visão, encontrou nas notas musicais a força para lutar contra as barreiras impostas pela doença e já sonha ganhar os palcos; amanhã fará show em restaurante



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No mundo particular de Israel Rodrigues Parreira, 11 anos, as conversas são movidas a música. Os sentimentos, brincadeiras e despedidas também.  

Do dó ao si, toda nota é a nota perfeita.

O menino, que convive com os obstáculos causados pela cegueira e transtornos do espectro do autismo desde os primeiros minutos de vida, demorou, mas descobriu qual é a melhor terapia em seu tratamento: soltar a voz.

Agora, o menino que vive cantando em todos os cantos da casa quer ganhar os palcos de Ribeirão Preto. E já tem data marcada seu segundo show solo: nesta sexta-feira (18) em um restaurante ma zona leste da cidade.

Junto a mãe, Marcela Rodrigues Parreira, e ao pai, Fabiano Adalberto Parreira, ensaia diversas canções na sala de casa. Enquanto ele canta e encanta, Fabiano o acompanha no violão. Marcela dança, sorri e aplaude incansavelmente não apenas as releituras, mas cada perspectiva quebrada.

O dinheiro arrecadado neste segundo show solo, onde interpretará canções de Milton Nascimento, Skank, Roupa Nova e clássicos da MPB (Música Popular Brasileira), será revertido no tratamento da criança. Segundo a mãe, o objetivo é oferecer ao menino melhor qualidade de vida e interação com o mundo exterior.

"Desde sempre, buscamos métodos que o ajudassem nesse processo, porque as previsões eram muito ruins. Tentamos de tudo e todos os brinquedos. Mas entendemos que a música é a porta de entrada do Israel", explica a mãe e fã número 1.  

Israel ensaia com os pais, Marcela e Fabiano, para o show desta sexta-feira (Fotos: Weber Sian / A Cidade)


Do luto à luta

Israel nasceu ainda no quinto mês de gestação, com 700g. Era considerado prematuro extremo e passou 120 dias internado na UTI pediátrica. Paradas cardíacas, hemorragias intracranianas e dezenas de exames periódicos fizeram parte do início de sua história.

Foram dias de muitos desafios e más notícias para a mãe, Marcela. A mais difícil delas veio no primeiro ano escolar, aos 4 anos.

"Uma das professoras nos chamou e disse que os comportamentos agressivos e atraso na fala do meu filho poderiam ter uma explicação. Aí, descobrimos o autismo", relembra a mãe.

O pai, no entanto, não desistiu. Em meio a uma correção severa, enxergou pela primeira vez o dom do filho especial.

"Era comum o Israel ter crises de birra e, nessa época, não conseguia se comunicar sozinho. Depois de uma delas, eu disse que estava muito bravo e não queria mais brincar", conta.
"Ele veio até mim e citou o trecho da música Onde Está Você, do Tim Maia. O curioso é que nunca tínhamos apresentado essa música a ele, mas a letra estava guardada em seu coração".

As notas musicais foram introduzidas em seu mundo acidentalmente, em uma vídeoaula para músicos iniciantes na internet. Hoje, participa de encontros específicos, se arrisca no grave da bateria e corrige Fabiano quando erra o ritmo.

Os estímulos, somados a anos de terapia e esforço, ressaltam os bons resultados.

Para custear os tratamentos particulares, a família acostumou-se a complementar a renda com rifas, sorteios de pratos de comida e, agora, com as apresentações. A última reuniu 190 apreciadores de sua luta.
 
Coitadinho, eu?

Nem só de música vive Israel. Fiel às atividades educacionais, iniciou as aulas de natação e braile na escola regular. Também superou limitações pessoais básicas e já se vira sozinho. Vai ao banheiro, alimenta e se locomove dentro de casa.

Anos atrás, isso certamente pareceria impossível, segundo Marcela.

"Independente dos médicos, quem vai me dizer até aonde conseguimos ir é o meu filho. No início, fui do luto à luta, porque o desafio era muito grande. Tudo nos abalava muito, mas aí fomos atrás, financiamos até o que não tínhamos só para oferecer todas as possibilidades a ele. E assim vai continuar sendo", diz.

Superado o período de adaptação com as necessidades especiais do menino, a meta agora é lutar contra o preconceito em torno das deficiências.

"Por muito tempo, deixamos de ter vida social porque as pessoas não entendiam o comportamento dele. Os obstáculos existiam para nós, mas são ainda maiores para ele. Então, o estimulamos na música para provar que não é um coitado, mas, sim, um guerreiro", finaliza a mãe.







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