TJ determina que prefeitura indenize família em R$ 50 mil

20/04/2018 08:19:00

Família entrou na justiça após homem morrer em 2007, após diagnósticos falhos em posto de saúde de Ribeirão Preto

Exemplo: Wilma Souza Meira diz que entrou na Justiça para que o fato que ocorreu com seu companheiro não aconteça com outras pessoas (foto: Matheus Urenha / A Cidade)
 
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O TJ (Tribunal de Justiça) mandou a prefeitura indenizar uma família em R$ 50 mil por erro médico, valor que deve ser corrigido desde a data do acidente. Ainda cabe recurso. O porteiro Christian de Oliveira, 31, foi atropelado na avenida Jerônimo Gonçalves, em frente à rodoviária, em 5 de janeiro de 2007.  

Doze dias depois, procurou o posto de saúde do Quintino Facci II (zona Norte) com dores no abdome e recebeu diagnóstico de dor no estômago. No mesmo dia, voltou ao posto com os mesmos sintomas e o médico manteve o diagnóstico. Nas duas oportunidades, não foram pedidos exames de imagem.  

Dois dias depois, em 19 de janeiro de 2007, Christian foi levado ao posto do Santa Cruz com dor abdominal, suor excessivo, febre e mal-estar.  

O médico o atendeu e cravou um novo diagnóstico: pancreatite aguda, e encaminhou Christian para internação na Beneficência Portuguesa. Um dia depois, em 20 de janeiro de 2007, o paciente morreu no hospital, sendo que a causa oficial foi pancreatite hemorrágica.  

A família dele entrou na Justiça em 2009 e em 2016 saiu a decisão em primeira instância, concedendo R$ 50 mil de indenização à família por danos morais.  

Neste mês, acórdão do Tribunal de Justiça manteve o valor concedido na primeira decisão, somente mudou a forma de calcular a correção monetária e os juros sobre o valor da indenização.  

"Conclui-se que o paciente Christian de Oliveira, companheiro da autora, com forte dor abdominal, ao se dirigir à rede de saúde municipal, não obteve o atendimento que, na ocasião, se fazia necessário", escreve o relator Spoladore Dominguez.
O pedido inicial da família era R$ 150 mil de indenização por danos morais e uma pensão vitalícia mensal de R$ 1,5 mil.  

"Como a cliente obteve uma pensão por morte pelo INSS, a Justiça indeferiu o pedido do benefício dentro do processo", explicou Samuel Domingos Pessotti, advogado de Wilma Souza Meira, 42, companheira de Christian.  

Wilma comemorou a decisão judicial, mas destaca que isso não ameniza a dor da perda. "Nenhum dinheiro vai trazê-lo de volta, mas entrei na Justiça para que isso não aconteça com outras pessoas", desabafou. 

Prefeitura analisa eventual recurso  

A Prefeitura de Ribeirão Preto declarou, por meio da Secretaria Municipal de Negócios Jurídicos, que o caso ainda "está sob análise da pertinência de eventual recurso" contra a decisão do Tribunal de Justiça. 

Morte enterrou sonhos do casal  

A companheira de Christian lamenta que a morte dele enterrou sonhos do casal. "A gente estava planejando se casar no dia do meu aniversário, em 20 de junho de 2007, mas ele morreu em janeiro. Queríamos também adotar uma criança, já que não posso ter filhos", afirmou.  

Wilma relembra que a morte do companheiro ocorreu sete meses após o falecimento do pai dela, em junho de 2006, em decorrência de complicações após uma cirurgia de coluna.  

"Depois que o Christian morreu, entrei em depressão e fiquei sete anos mal. Comecei a me sentir melhor há três anos. Ele era minha alma gêmea", diz. 

Quatro anos de convivência  

Christian trabalhava como porteiro e foi justamente a profissão que uniu o casal. Wilma relembra que ligou no condomínio para conversar com um amigo e Christian atendeu ao telefonema. A empatia foi imediata e marcaram de se conhecer pessoalmente.  

Christian estava casado havia pouco mais de um ano e terminou o casamento para engatar o romance com Wilma. Foram quatro anos de união, até o acidente que interrompeu os sonhos do casal de forma abrupta. Hoje, ela guarda a coleção de miniaturas de carrinhos dele, além de roupas e a Bíblia do companheiro. 

Análise  

Condenações ficam estáveis 

"O aumento do número de processos por erro médico é fato. Melhorou o acesso da população à Justiça e cresceu a precarização da saúde. O MEC vetou a abertura de novos cursos de medicina nos próximos cinco anos. Entre 2010 e 2014, o número de ações que chegaram ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) cresceu 140%. Nas instâncias inferiores esse crescimento é muito maior, já que nem todo processo chega a subir. Um levantamento recente feito pelo Colégio Brasileiro de Cirurgiões mostrou que 14% dos médicos brasileiros já foram processados sob a alegação de erro médico. Também cresceu o número de denúncias nos Conselhos Regionais de Medicina. Mas o número de condenações no Judiciário ou na esfera administrativa não acompanhou e ficou relativamente estável, já que muitas ações não são devidamente fundamentadas." (Luciano Bueno Correia Brandão Advogado especialista em direito à saúde)
 
Cronologia   

5 de janeiro de 2007  
Christian sofre um acidente de trânsito ao ser atropelado na avenida Jerônimo Gonçalves, em frente à rodoviária; 

17 de janeiro de 2007 
Ao sentir fortes dores na região abdominal, o paciente procura o posto de saúde do Quintino II;  

Às 13h55 Christian é atendido pela primeira vez no posto e recebe diagnóstico de dor no estômago, com indicação de medicamentos para amenizar as dores;  

Às 21h49 com dores mais fortes, o paciente volta ao mesmo posto e recebe o mesmo diagnóstico e conduta terapêutica. Nenhum exame complementar, como de imagem, é pedido pelo médico; 
 
19 de janeiro de 2007 
Christian volta ao posto de saúde, desta vez do Santa Cruz, com dor abdominal, sudorese, febre e mal-estar. O médico dá outro diagnóstico: pancreatite aguda, e encaminha o paciente à internação na Beneficência; 
 
20 de janeiro de 2007 
Christian morre e a causa oficial da morte é pancreatite hemorrágica; 
 
28 de maio de 2009 
Família entra com processo na Justiça pedindo indenização pela morte de Christian; 
 
28 de novembro de 2016 
Justiça manda, em primeira instância, prefeitura indenizar família em R$ 50 mil; 
 
Junho de 2017 
Prefeitura recorre da decisão no Tribunal de Justiça; 
 
11 de abril de 2018 
Tribunal de Justiça mantém decisão em primeira instância e manda prefeitura indenizar família em R$ 50 mil;



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